quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

A mensagem

Estava sonhando não lembro já o quê. Era um sono agitado, atrapalhado por um estômago cheio. No meio daquela confusão - semi desperta ou adormecida - um terceiro BIP do celular, finalmente me trouxe à superfície do mar agitado em que me debatia.

Depois de alguns segundos necessários para me localizar, dentro de mim ao menos, peguei meus óculos e o celular para receber a mensagem que ele anunciava. Nessa emersão tive tempo de pensar que: era o terceiro BIP; que minha bexiga estava cheia mas não seria atendida; que seria possível que o celular tivesse tocado e eu não tivesse ouvido? Que era uma mensagem e que podia ser da Vivi, minha amiga que estava com o amigo no hospital e com quem eu não tinha falado o dia anterior todo embora tivesse pensado nisso várias vezes; que eu já tinha me esquecido do que estava sonhando...

Abri o celular, teclei o comando de ver a mensagem, esperei o foco se ajustar e li:
"Terminei minha farsa!namoro d
mentira!desculpa por ter
te mentido!cai no conto
da fantasia!preciso d
ajuda p esquece-lo,ele é
perigoso vestido
branco!bj
De:04199888666"

Li até aí e tudo de novo. A. tinha se levantado e ido ao banheiro. Voltou e perguntei as horas. Deve ser lá pelas quatro. Foi o hospital? É paciente? Não sei. Virei pro lado e fui mergulhando no sono de bexiga cheia novamente... eu conhecia aquele número?? Alguma paciente tinha me falado aquelas palavras: namoro de mentira?

No novo sonho - ou era o mesmo? eu estava com amigos e primos em uma espécie de festa numas ruínas, e com minha amiga Lena, pulava uma corda invisível contando de 10 em 10 até cem, sem cair ou errar, não importando como ela balançasse a corda nem que a mesma fosse invisível.

O despertador tocou às 6:30 para ser desligado várias vezes até tocar novamente às 7:30 e me fazer levantar.
De baixo do chuveiro com água e shampoo a me escorrerem pelas ventas, fui esquecendo o sonho, sem sentido, e lembrando a mensagem mais ainda incoerente, anacrônica, inoportuna. Curiosa, fui relê-la. Não tinha assinatura. Foi enviada, ou recebida no meu aparelho às 2:42h. Fiquei tentada a ligar para o número que a tinha enviado.
Obviamente, não era eu a real destinatária. Tentei buscar na minha memória, dentro dos dramas e estórias que escuto no dia-a-dia de meu consultório de ginecologia/obstetrícia/adolescência/psicologia?, alguma que se encaixasse. Alguém que, me pareceu, me tivesse dito em algum momento, aquela pequena cadeia de palavras: "namoro de mentira". Parecia me lembrar. Não consegui encaixar com nenhuma face, nenhuma pessoa. Aquela que me ligou com teste de gravidez positivo, que tem namorado e amante? Aquela mais velha, casada e descontente que arranjou um namorado mais novo e estava até mais feliz?? Mas por que diabos pediria desculpas por ter me mentido? E por quê me mentiria? Eu, meio confessionário, meio ginecologista?? Teria a pessoa, da mensagem, se envolvido com algum médico que eu conhecia, e me pedia ajuda para esquecer o "perigoso vestido branco"?? Sim, pois assim estava escrito: "ele é perigoso vestido branco" embora eu tivesse lido: "perigoso vestido de branco". Não, não fazia sentido!

O número me parecia conhecido. Procurei na lista de chamadas anteriores. Não estava lá. Mas provavelmente é mesmo conhecido. A pessoa, essa mulher, deve ter o meu número em seu elenco de registros e ao tentar enviar a mensagem para a pessoa correta, algum M ou D de seu elenco, sem querer, mandou para mim. Ou teria sido um acaso ainda maior?? Foi digitanto os números, na urgência de sua ansiedade e uma combinação errada, ou uma tecla trocada fez a mensagem se dirigir à mim?

Segurei a vontade de ligar para o número ou responder a mensagem. Fui dando asas a imaginação, deixando os pensamentos seguirem. O primeiro foi: isso dá um conto! Claro, pode dar uma aventura. Paul Auster tem no mínimo um conto em que tudo começa com um telefonema enganado que o herói recebe na madrugada. Me refiro ao primeiro conto da Trilogia de Nova York. Com ele a coisa se repete, havia mais que uma troca de números. Todo um jogo com nomes de autor, narrador e personagem. Uma de suas obra-primas do realismo fantástico. Lembrei ainda de Griffin e Sabine, toda uma estória de amor e suspense em 3 deliciosos volumes, cheios de lindas ilustrações e envelopes com cartas e cartões, num jogo divertido com o leitor, que se não me falha a memória começa com uma correspondência meio estranha e mal explicada.

Fiquei imaginando qual seria a estória desta moça. Teria um namorado não aceito pela família, quem sabe casado, ou pobre, ou rico demais?? e começou o namoro com outro que a cortejava, para agradar os pais. Um moço aceitável, médico de profissão, com quem iniciou o que chama de farsa... Não, não gostei desse enredo. Não faz muito sentido com as frases que ela escreve.
Por quê seria uma farsa?? Por quê teria ela caído no conto da fantasia? A fantasia seria de médico? Médicos já nem sempre vestem branco. Muito mais os dentistas, fisioterapeutas, esteticistas... Por quê precisaria de ajuda para esquecê-lo? Por quê era perigoso vestido branco? Ou o vestido branco seria a fantasia, o conto no qual tinha caído?? Esperava casar-se?? E por quê teria mentido para a suposta pessoa em meu lugar? Seria ela (a pessoa) seu namorado? Seu amante? Ou sua namorada?? Por isso o outro namoro teria sido de mentira. Tinha tentado um relacionamento hetero para ser aceita pela família, mas apaixonou-se pelo médico/fisioterapeuta/esteticista que tinha mãos delicadas, fazia deliciosas massagens e um amor suave, muito mais de preliminares que de consumação. Depois, em algum momento, ela descobriu que ele também era ambivalente em sua sexualidade e buscava o mesmo que ela, a aprovação social num casamento de mentira. O perigoso vestido branco seria usado por ele... Ela confundiu-se, perdeu-se, sentiu-se traída. Voltava então para sua companheira a quem tinha mentido, pedindo desculpas e ajuda para esquecê-lo. Esquecer o engano em que se havia metido. Tão enganada estava, que trocou o número na hora de enviar a mensagem... que veio parar comigo.

Nestas suposições e outras, passei ontem o dia inteiro. Ainda me segurando para não discar o número ou responder a mensagem. Envolvendo-me de corpo, mas não de alma, com minhas tarefas diárias, minhas outras pacientes, meu horário na fisioterapeuta/acupunturista - ô palavra terrível!

Fui dormir tarde, depois de sair com uns amigos que falavam e falavam, de outras coisas, que não conseguiam afastar minha mente da inquisição do mistério.
Outra noite de sonhos agitados e não lembrados. Minha mente continuava cativa da mensagem...

Desta vez escutei chegar. Estava como que antecipando. Ainda assim, não emergi no mesmo instante. Fiquei semi-vigilante até o primeiro BIP. Coloquei então os óculos e lá estava:
Obrigada pelas oraÇoes
e o insentivo hj nasceu
uma luz q jamais se
apagara!quase surtei,+
venci.d coraÇao
obrigada!te devo
essa!beijos meus queridos
e ate
De:04199888666
4:38 20/02/08

Tive que levantar, ir ao banheiro, tomar um pouco de água. Tudo estava grafado exatamente assim e fazia menos sentido ainda. Então, de alguma forma a mensagem tinha chegado a algum destinatário correto. O pedido de ajuda foi atendido com orações. Ela teve um quase surto rápido e por milagre e obra da caridade divina acionada pelas preces dos amigos, viu nascer uma luz que jamais se apagará. Foi salva!

Agora eu é que estou presa. Refem total da curiosidade, que me faz pensar várias vezes ao dia em tentar estabelecer um contato mais imediato, para dar alguma concretude a esta quimera que me assombra a madrugada. E ao mesmo tempo, presa de uma outra sensação que é aquela de ficar aguardando, na espera do próximo acontecimento. Viciada no gostinho do mistério absurdo. Não do que vai acontecer com ela, agora iluminada, mas com nosso contato fortuito.

Meu lado persecutório ainda fica buscando algum indício de que sou eu a destinatária justa. Só não lembro quando e não sei porque.
Quem, entre tantos meus conhecidos, poderia estar apenas se divertindo comigo? Cheguei a desconfiar de minha amiga cronista, que nas madrugadas fica, sengundo ela própria, perigosamente diferente em sua inspiração e diz e escreve coisas que normalmente não faria.
Mas esse não é seu número. Nem de telefone, nem, até onde sei, de espetáculo. Ela faz fantasia da realidade. Ou melhor, ela conta a realidade tão bem contada, que a torna em sonho. Seus mistérios, são coloridas estória dela mesma e de seu dia-a-dia, ou pontos e pedacinhos de tecidos magicamente combinados. Acho... não, tenho certeza, que tem muito mais que escrever, que mensagens desconexas a enviar aleatoriamente e ver no que dá.

O louco, ou engraçado, é como uma coisa destas pode fazer a gente reagir de tantas formas diferentes.É incrível pensar todo o intrincado caminho que segue a comunicação humana. A diferença de sentido que há ou pode haver entre a mensagem enunciada e aquela recebida.


Isto tudo aconteceu nas madrugadas de segunda para terça-feira, e de terça para quarta. De quarta para quinta, nada aconteceu. Quinta à noite, eu ainda me debatia entre a vontade de ligar para o número, que me parecia sempre, intrigantemente conhecido, e a outra, de deixar o mistério no ar, viajando nas suposições e estórias criadas pela minha imaginação.

Acabei cedendo ao meu lado mais humano e feminino, ou simplesmente curioso, e ligando para a pessoa que tinha enviado as duas mensagens. Que passou a ter voz, nome, face e razões para ter feito aquilo.

Parte de minhas suposições estavam certas. O número era mesmo conhecido. A pessoa tinha mesmo meu número na sua lista e também era a mesma que tinha me falado no consultório, sobre o "namoro de mentira".

Sua história pessoal, não tem nenhuma proximidade com as suposições que levantei, mas nem por isso, seu porvir torna-se menos intrigante.
Agora tem mais cor, saber e dor.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Ensaio

Ó vida! Louca aventura teatral que não te ensaiei e nem um só lance d'olhos dei em teu script.
Ó dura indivisibilidade do homem a carregar uma alma tão múltipla!
Tantos personagens, uma só casca.
Ó louco coração a bater descompassado, qual dono não tivesse, a buscar agasalho em abrigo alheio.
Fora da lei. Fora da ordem. Fora da lógica do dia-a-dia.
Ó peça, que assustada esbocei sem chance de retoque!
E o que será desta obra afinal?
Amanhã, só amanhã saberei.

Sonho

Abriu os olhos de repente e tornou a fechá-los.
Não, não era dia de se acordar assim, de súbito.
Respirou devagar e profundamente e deixou o sonho dominar-lhe a mente e o corpo outra vez. Ainda podia sentir a vibração em cada músculo... Aos poucos foi deixando o despertar acontecer e a sensação afastar-se. Olhou através do voal do cortinado e da janela aberta. Era cedo ainda e a manhã já se fazia morna. A sombra da parede vizinha só disfarçava um pouco, dando uma ilusão de frescor no breve corredor. A terra exalava seu aroma doce e seco, próprio do verão ali.A janela da parede vizinha, a do sotão, permanecia fechada. Como alguém podia ficar lá com tudo fechado??? O calor aumentava dentro e fora do quarto, dentro e fora do corpo...
Deixou-se ficar um pouco mais, semi-enroscada nos lençóis úmidos. Que preguiça! E aquela vibração que teimava em prevalecer na cabeça, no coração, nas pernas, na cama, no quarto... e até na bruma do ar lá fora!!
Fora mesmo um sonho?
Levantando lentamente, tentou conectar as idéias, o sonho com a realidade. Lembrou o chopp gelado deliciando sua garganta e a impressão à entrada daquele homem, que cumprimentava a todos os seus grandes e velhos amigos ali presentes mas que ela nunca havia visto antes. Ele veio sentar-se a seu lado. Olhou-a demoradamente como se fosse uma predra exótica ou um animal raro, fazendo-a sentir-se...nua?
Logo conversavam animadamente. Todos queriam ouvir as estórias que ele tinha para contar. Ele falava de mil coisas, lugares, pessoas, fatos interessantes. Aquele homem era um poço! E ela bebia - daquela água encantada e do chopp. Olhavam-se muito, direta ou disfarçadamente. Os olhos dele eram de um marrom profundo e penetrante. Seu rosto coberto de barba e mistério. Dos cachos de seus cabelos emanava um perfume de países distantes. Era alegre. Seu riso contagiante. Bem falante, inebriava a todos.
Ela pegou um cigarro de alguém e tentou se esconder um pouco atrás da pequena cortina de fumaça não tragada. Inútil! O sorriso dele brilhava e seu olhar alcançava dentro dela. O chopp começou a acabar rápido demais e sua sede aumentava. O calor piorou. O ar do ambiente parecia não conter um mínimo aceitável de oxigênio.
Ele pegou em sua mão e convidou-a para andar na praia. A brisa do mar refrescou seu corpo e afagou seus cabelos. As mãos dele também. Ela sentia que o mundo poderia continuar girando indefinidamente.
Dançaram a canção das ondas e beijaram-se. a língua dele era quente,suas mãos ávidas e gentis, seu corpo ágil, perfumado. Ele era todo exigente. Seus corpos, juntos, seguiam a melodia da maré, vivenciavam a harmonia do cosmo. Entregavam-se um ao outro no esforço crescente da fusão total. E a dança se repetia. Novos passos, novos toques, novos universos. Que nada tivesse fim! Que tudo pudesse acabar naquele instante.
Como chegara em casa depois?
Ah! Ele a trouxera embalando pelas ruas. Vieram brincando com os cachorros, correndo com os gatos, pulando muros e cercas, cortando caminhos que ela conhecia desde criança.
Na porta da casa, depois do último dos beijos, ele disse um Tchau casual e riu da coincidência de serem vizinhos. Entrou na casa ao lado, debaixo de seu olhar pasmado, rindo sempre e dizendo: até amanhã!
Seu corpo ardia. Suor com areia, com sal, com desejo, com satisfação.
A água do chuveiro frio foi sua última carícia.
Molhada deitou-se para continuar a sonhar.

1996

Paraval

E tudo lembra Santa Catarina e Paraná
E tudo lembra viagem
E tudo cabe na paisagem
Se se permite a bobagem de viajar.
De avião, de trem, de ônibus, de navio
Ou mesmo só com o pé no frio
e a cabeça no ar!
Ou até virando Cristiane F e voando na maioneze.
Somos um grupo ou não somos????

1996

Augurio

"Eu conheço esta cara, esta fala, este jeito"
Que tem muito de louco, de sonho, de maroto e de gênio.
Que tem muito que dar e mostrar.
Que tem muito que viajar.
Há 30 muitos Balzaqueando
Há quase 3 que encontrei
Por quantos nos há de encantar, surpreender, presentear???
Versão 96 reeditando o melhor sorriso. O lado internacional.
A vida soltando amarras indo de encontro ao mundo.
Com a coragem e a bagagem presa apenas da leveza, do encanto e da surpresa.

Que te vayas bien hija
por los treinta
por todo el vasto mundo
el tuyo e el nuestro
que es una bola
e pronto nos vemos sempre.

Para todos os frascos
e estes,
para todas as essências
para se beber ou aspirar
Para viajar!!!

ENTÃO

TEU SILÊNCIO, TUAS PALAVRAS,

TUAS ATITUDES E TEU OLHAR

TANTAS CONTRADIÇÕES.



COM QUAL DEVO FICAR????

Caminho

Só, pelas ruas caminho sem destino.
Só, pela vida sigo em frente, sempre.
Só, em meu coração aqueço os que passam.
Pinto matizes coloridos na minha, nas nossas vidas.
Brilho sorrisos e olhares sedutores.
Apaixono estórias com finais tristes e felizes.
Canto desafinada a canção do tempo.
Brinco adulta, adulterando a ordem dos fatores da vida.
Atropelo a luz do pensamento.
Com o corpo livre danço o som bemol maior do teu olhar.
Recebo-te.
Abrigo-te.
Abrigo-me no amalgama quente que penetra nosso gozo.
Colho o fruto e como-o ávida,
Acariciando a flor que fenece para fechar o ciclo
e iniciar o novo.
Abanada no Adeus.

Mantra

Nasci e me foi dado um nome.
E, de pequena, deitada em minha cama olhando o teto e vendo o universo,
Brincava de pronunciá-lo sem parar,
Até o fim grudar-se no começo e ele perder seu próprio sentido,
me embalando no som de vai e volta que produzia.

Fui crescendo, aprendi e conheci muito.
Busquei o amor e a felicidade.
E fui me procurando nos homens que amava.

Então, comecei a pronunciar os seus nomes cada vez que sentia minha falta.
Mil vezes pronunciei diferentes nomes.
Buscava a ilusão de não estar só.
De volta, recebia um eco morto.

Hoje, inicio o caminho de retorno.
Revolvo a poeira e timidamente procuro em minhas próprias entranhas.
Ensaio novamente e balbucio meu nome.

Amel de verdade

Atenção!
Atenção!
Estejam todos muito e sempre atentos!
Hoje, nasce uma estrela de quatro pontas.
Com um coração enorme ainda que meio torto, e que doa sempre um pouco, ao bater no seu ritmo único e incrivelmente acelerado.
Com um cérebro um bocado mais emaranhado e enosorocado que da maioria dos mortais,
Que tem mania de estar a conceber manhas e artimanhas bem à portuguesa,
Mas que não nega certa destreza a pensar a humanidade no que ela tem de bom ou ruim,
trágico ou cômico,
real ou virtual,
apenas a depender de um ponto de vista.
Com mãos de uma força incrível, que com a mesma leveza pegam uma criança e a fazem morrer de rir,
ou destroncham um cérebro de coelho a mordê-lo famintas,
após mandar por terra todas as batatas do mundo.
Uma estrela cadente, vivente, pulsante e incandescente.
Que resmunga pela manhã, brilha ao crepúsculo e filosofa na madrugada.
Chora após três doses de whisky com coca-cola,
Adora champagne na Patagônia e tem uma quedinha pelo Brasil - Yes!
Gosta ainda de domar feras e adormecer as belas
melenas e pequenas criaturas que, incautas, se deixam hipnotizar por seu brilho
um tanto quanto psicodélico,
seu canto,
um tanto quanto mefistofélico, luciférico ou angélico.
Toquem e cantem, rumbas, tangos, rocks ou boleros,
lambadas e sambas,
Porque é na bossa-nova que ela vem dançar com seus atinos e desafinos,
e gingar no coração de todos mortais gogoles que a contemplarem!

1996

BELIZE

Há uma grande pessoa, de imensa beleza, que conheço há um certo tempo - mas que sempre conheci - e que, não sei porquê, não se conhece.
Tem a imaginação rica, cria coisas maravilhosas.
Tem um sorriso brilhante e pungente e traz nos olhos tristezas do mundo inteiro, que lhe calam fundo e povoam a faixa que existe entre ela e o espelho.
Então, ela não se vê, e para calar a dor, vai se cegando.
Então, ela não se ouve, e para abafar seu grito, está parando de respirar.
Numa espiral vertiginosa sua luz a vai tragando num infinito mergulho de mêdo, de atravessar a barreira e ver, que do outro lado, o espelho tenta lhe mostrar sua beleza.
Tal como os príncipes dos contos de fadas, seu espírito aprisionado retorce a sua face e fustiga seu corpo, clamando por uma brecha para alcançar a expansão e a plenitude.
Ela, noentanto, qual princesa assustada e indefesa, insiste em correr e fugir, tecendo dolorosamente a trama da sua couraça.
Mil vezes abandona seu porto e se lança no oceano bravio, surda ao canto das sereias de sua alma, cega ao seu próprio farol. E deriva, ao sabor de seus fantasmas insaciáveis a devorá-la na solidão de si mesma.
Encontramo-nos num sonho que ao soprar do vento, toma as cores de pesadelo e agita nosso sono eterno.
Olhamo-nos.
E, se não me engano, vi em seus olhos a luz do fim do túnel.
E percebi que era um espelho.
E enquanto vou caindo no abismo de meu ser, no delicioso e assustador mergulho no infinito da minha alma, penso seu nome.
E o som sai doce na tentativa de alcançá-la e fazê-la acordar enfim!

1996

sábado, 9 de fevereiro de 2008

Prece paciente

Quem me dera um mágico bisturi
que ao abrir meu peito, promovesse a troca
deste coração magoado, descompassado,
"viciado em amar errado",
e colocasse outro mais esperto.
Com marca-passo ritmado.
Que escolhesse para amar, alguém
que pudesse e permitisse,
simplesmente ser amado,
e retribuisse o amor,
igualmente descomplicado.

1995

Testamento

E quando não mais tivermos a lamentar
se não o fato de já não lamentar-se mais mesmo.
Talvez então, expectadoras de nós mesmas,
possamos, de mãos dadas com a morte,
benfazeja e maldita,
sermos mais complacentes com aquelas que fomos,
ou deixamos de ser.
Enfim felizes.
1995.
Se há poesia
há vida
a vida do dia- a- dia
fica menos vazia, vadia.

Varia conforme o sol
do meio dia
da meia noite
de dentro da gente.

1995

Meditação

Correndo no parque, no frio da manhã,
atrás dos próprios pensamentos,
vendo o sol surgindo a sua frente vencendo a densa neblina,
ela percebe que vale a pena continuar.

Porque é mulher,
porque cresceu,
porque endureceu e se fez mais terna e
porque enfim, a vida pulsa inexorável em seu coração ferido
aguardando o sol!
1995

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

O conselho que ganhei indiretamente.


"_ A melhor coisa a fazer quando se está triste - respondeu Merlin, começando a fumar e a soltar baforadas - é aprender alguma coisa. Essa é a única coisa que nunca falha. Você pode ficar velho e trêmulo em sua anatomia, pode passar a noite acordado escutando a desordem de suas veias, pode sentir saudades de seu único amor, pode ver o mundo ao seu redor ser devastado por lunáticos malvados ou saber que sua honra foi pisoteada no esgoto das mentes baixas. Só há uma coisa para isso: aprender. Aprender porque o mundo gira e o que o faz girar. Essa é a única coisa da qual a mente não pode jamais se cansar, nem se alienar, nem se torturar, nem temer ou descrer, e nunca sonhar em se arrepender. Aprender é o que lhe resta. Veja a quantidade de coisas que existem para aprender - ciência pura, a única pureza que existe. Você pode estudar Astronomia no decorrer de uma vida, História Natural em três, Literatura em seis. E então, depois que tiver exaurido um milhar de tempos de vida em Biologia e Medicina e Teo-crítica e Geografia e História e Economia - ora, você pode começar a fazer uma roda de carroça com a madeira apropriada, ou passar cinqüenta anos aprendendo a começar a vencer seu adversário em esgrima. Depois disso, pode começar outra vez a Matemática, até chegar a época de aprender a arar a terra."


WHITE, T.H. A espada na pedra ; tradução de Maria José Silveira. _ São Paulo: W11, 2004

Auto justificativa

Iniciei este blog, muito por incentivo de uma grande nova amiga minha, Juliana, uma mulher linda forte e maravilhosa,que me mandou o endereço do seu, o qual visito sempre para ler as deliciosas crônicas que escreve. Seu exemplo deu-me coragem para começar a me aventurar também.

Escrever é uma coisa de que gosto muito, entre as muitas coisas que gosto. Em alguns momentos escrevi coisas de que gostei suficientemente, na época, para achar que valiam a pena serem guardadas e eventualmente mostradas para uma ou outra pessoa mais íntima.

Sou uma pessoa bastante comunicativa e até um pouquinho exibicionista, numa dose que considero normal, ou seja, não o suficiente para buscar a fama pública a qualquer custo, mas o bastante para querer ver meu trabalho ou minhas produções apreciadas pelas pessoas que considero.

Tenho uma relação engraçada com as coisas que escrevo. Gosto de relê-las de vez em quando mas sou cheia de críticas , embora goste delas encontro-as a cada vez, mais cheias de defeitos e o que é pior, não sou daquelas pessoas que ficam burilando, burilando até chegar numa forma para elas mesmas aceitável ou perfeita.
É como se cada coisa que escrevo, depois de pronta, adquirisse vontade própria e não me deixasse mais tocá-la. Assim, fico com ela, a coisa, nessa relação ambivalente. Quero mostrá-la e receber do outro a aprovação, o sinal de que obteve prazer em ler o que escrevi, mas ao mesmo tempo fico com a certeza de que o outro vai dizer: que tolice; que coisa mais boba; quem tem coragem de escrever algo assim; tanta coisa mais interessante e formas melhores de escrever estas coisas e essa pessoa escreve assim.

Sou assim. Um ser ambi ou multivalente que oscila para lá ou para cá, ou para todos os lados querendo crescer, querendo dizer, querendo aprender e querendo mostrar o que sabe e o que gosta, nunca se achando bom o suficiente, almejando ser grande mesmo, mesmo sempre se achando aquem do que gostaria.
Narcísico tanto?? Imaturo?? Inconsequente??

O Pseudônimo é meu lado covarde ou mais ainda exibicionista. Sempre quis ter um.
A imagem é um belo lugar onde estive e onde me senti mais que nunca borboleta, multicor, livre, leve, feliz e cheia da energia criadora que passeia o universo. No encantamento de estar no meio de grandes obras do homem e da natureza.

Os textos, por enquanto, são os do passado. Passá-los para cá ajuda-me a organizá-los de várias formas.
Enfim, aqui mais um espaço de organização de mim.
2008

domingo, 3 de fevereiro de 2008

Já era noite

Já era noite...
Só uma sombra na rua.
Caminhando lentamente pela escuridão da noite.
Era uma mulher. Uma mulher triste e sozinha que em cada passo que dava demonstrava amargura, mêdo, revolta...
A causa disto?? Ninguém sabe.
Só se sabe que se chamava kate e vinha de um lugar muito distante.
Dizem ser um lugar muito bonito e cheio de alegria. Talvez por isso tenha saído de lá.
O fato é que ela caminha, caminha o tempo todo, sem parar um minuto, um segundo sequer.
Já é noite alta. Uma hora decerto.
Ela está chegando ao seu destino.
Está perto, muito perto. Não vai demorar a chegar.
De repente, na sua frente, surge um clarão que avança rapidamente e vai embora em disparada maior.
Agora o silêncio é completo.
Nem mais um vulto na escuridão da noite. Só uma figura inerte caída no chão, que saiu de algum lugar quando já era noite.
1974.