quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Ronda





Vegetara até aquele dia.
Até aquele inusitado momento em que sem nenhuma razão, resolvera clicar naquele simbolozinho Barrigudo que encontrara na tela.
Um mundo se abriu.
Desde então, passava as noites passeando nos mais diversos blogs.
Um dia encontrou um especial.
Tão especial como qualquer outro.
Mas de uma estranha maneira, tinha sempre a impressão que o autor falava dela.
Não com ela.
Não tocava sua alma.
Não inundava seus olhos com lindas imagens.
Falava dela como se a conhecesse e a acompanhasse no seu triste perambular vegetativo.
Nos breves textos, quase poéticos, contava toda a sua história sem graça.
Desde o dia em que nascera, não desejada nem recebida.
Sua infância solitária.
Sua adolescência insípida e míope.
Sua maturidade prematura e inconsistente.
Sua incapacidade de tornar-se mulher perante um homem.
Sua inépcia para estar no mundo.
E de alguma forma, na forma como ele contava, parecia diferente.
Era ela, tinha certeza. Falava dela. Mas parecia interessante, concreta.
Ali, adquiria sombras e contornos.
Sua vida ganhava traço.
Parecia até humana.
Não importava quanto perambulasse, embriagando-se em blogs de fotografias, poesias, músicas....
No final da ronda terminava ali.
Só ali se encontrava.
Ali lavava o rosto e penteava-se.
Era seu espelho.
Despia sua transparente inexistência e trajava seu avatar.
Ali vestia-se para enfrentar o sono e o seu dia acordado de viver.




Imagem Picasa - Esperanza>Piezas de puzzle - Jigsaw pieces

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Sábado de Carnaval

Depois de encontrar Apolo no parque ela voltou para casa, cozinhou e comeu sua comida.
Assistiu pela enésima vez as PONTES DE MADISON que brindou com lágrimas nos olhos.
E bebeu vinho, por que, na maioria das vezes, a vida é nada.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Desejo


Só hoje, talvez não.
Mas hoje eu não quero mais o sangue nas mãos.
Não quero mais a vida pendurada na ponta do meu bisturí.
Não quero mais a doce delícia de brincar de Deus.
Não quero a responsabilidade, a vida, a felicidade.
Não quero saber nada.
Quero ver o amor nascer e nem pensar na dor.
Quero sentir a dor rasgar e não ter nada com isso.
Quero ser isenta.
Quero a absolvição prévia dos ingênuos e ignorantes.
Dos bem aventurados pobres de espírito.
Das criancinhas.
Quero cantar uma canção sem saber a letra.
Quero assobiar o poema e rir até me acabar, de rimar bunda com funda.
Quero a cacofonia me fazendo cócegas na barriga.
E o arrepio e medo só do mergulho.
Quero andar no escuro tateando os monstros e rir de seu desaparecimento quando encarar a escuridão.
Não quero a luz.
Quero o canto da sereia.
Me afogar e gostar.
E sumir na imensidão do mais fundo do mar.
Quero ser a onda lambendo a areia e me entranhando nela.
Quero ser o anjinho levando o mar numa conchinha para o buraquinho.
E acreditar que isso é só uma brincadeira e não um enigma para atomentar a alma do homem que pensa e pergunta.
Só hoje eu quero ser Amélia e fazer um pudim de claras, perfeito e doce.
E comê-lo inteirinho com molho de vinho ou de baunilha,  prendendo entre os dentes as lasquinhas de limão.
Quero brincar de palavras grudadas e repetir até a exaustão o mesmo som , até ele perder o sentido qualquer que tenha tido.
Quero sair andando sem me importar para onde e voltar só depois de muitas voltas.
Outra.
Outra eu.
Outra dor.
Outra vida.
Ainda que a mesma.
Só hoje não ser eu.
Olhar-me no espelho e encontrar o gato da Alice.
Só o sorriso.
E o rabo.


Imagem:Picasa Lino>miscelanea. Caracol presumido

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Intervalo

Sentou-se com o lap top ao lado, na diagonal.
Na sua frente o prato do dito almoço. De dieta, nem "rozcovo", comida russa como dizia a prima, era permitida.
Tinha misturado o que tinha. Algumas tiras tricolores de pimentão. Alguns tomatinhos. Queijo Cottage. 2 ovos estalados na Tefal. Sem gordura. O azeite forte com alho, gengibre e pimenta branca. Uma pitada de sal outra de pimenta preta.
Almoço frugal.
Às 15:30h.
Sacrifícios da idade. Do trabalho. Do tempo exíguo.
Comeu sem muita atenção.
Fixada na tela do computador.
Viajou rapidinho aos espaços mais próximos e voltou ao seu.
Alheiamente concentrada (paradoxo para ela sem nenhum mistério) tentou encontrar alguma coisa inteligente, interessante, engraçada, qualquer coisa para digitar.
Registrar.
Dar sinal de vida pensante.
Ao menos para si mesma.
Não conseguiu.
O tempo fugiu enquanto todas as idéias se atropelavam para tentar formar uma linha.
O telefone tocou.
A hora chegou.
Foi fazer o que tinha que ser feito.
Talvez mais tarde.
À noite.
Amanhã.

Imagem: Esperanza>Piezas de puzzle - Jigsaw pieces

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Apropriação in débita mas permitida e abusada.

Do comentário do meu comentário à Bípede, ligeiramente modificado:

Fora isso.          


Palavras são para serem repartidas e multiplicadas.