quinta-feira, 10 de julho de 2008

Conto do Negócio

Tudo dera absolutamente certo. Sua vida começara da maneira certa e tudo fora caminhando como esperado.
Não nascera em berço de ouro, nada disso, mas no lugar certo, na família certa, na hora certa.
Seus pais eram os que tinham dado mais certo nas suas respectivas famílias. Ambos vindos daquelas típicas famílias de classe média, com 2 irmãos mais novos. Tinham escolhido a medicina e eram felizes no que faziam. Só um erro. Não tinham conseguido se acertar juntos. Talvez por serem, cada um à sua maneira, inteligentes e voluntariosos demais. Haviam mergulhado separadamente em seus trabalhos, suas conquistas. Competiam. Não conviviam.
Até isso, de certa forma, tinha sido bom para ele. Competiam em tudo. Em lhe dar os melhores presentes, a melhor educação, o melhor incentivo, o melhor conselho…
Ele fora aproveitando o melhor de cada lado. Vendo os dois submergirem em seus trabalhos, decidiu que a medicina não lhe servia. Ele queria ter uma família que se reunisse às refeições em volta da mesa, conversando animada e degustando a vida.
A mãe cozinhava bem. Tradição de família. As avós faziam delícias dignas dos melhores restaurantes. Ele adorava sapear pela cozinha, sentindo os aromas, adivinhando os sabores, provando o paladar.
A mãe lhe dizia: escolha uma coisa que gostes de fazer. Trabalhe no que gosta e nunca vais trabalhar na vida.
Sua mente ágil não teve problemas em organizar tudo. Divertia-se tanto nos cursos de culinária como na faculdade de administração, onde a mágica dos números o encantava e tudo encaixava certinho.
Aos 21, com o diploma debaixo do braço, facilidade para as línguas e uma vontade de ganhar o mundo maior que o próprio, embarcou para a Europa. A Itália era a mãe de seus sabores, a França a sua roupagem, os países nórdicos sua resistência, os orientais sua extravagância, a África sua doçura e exotismo. As comidas, os costumes, os perfumes, as pessoas, tudo o fascinava e criava em seu espírito inspirações de sabores e combinações inusitadas. Pratos diferentes se materializavam em suas mãos e deliciavam quem os provava. Foi premiado pelo mundo todo.
Voltou e abriu seu pequeno restaurante. Ali, seus amigos, família, ilustres desconhecidos se reuniam sempre às refeições e conversavam, riam, bebiam e comiam.
O lugar estava sempre cheio, sua forma animada de atender, cozinhar e servir atraía cada vez mais clientes, que sempre saíam satisfeitos e voltavam.
Ela apareceu como representante de vinhos. Tornou-se freguesa. Almoçava todos os dias, jantava quase sempre. Conversava e contava estórias deliciosas.
Começou a fazer a diferença, já não era mais capaz de ficar com a sua ausência.
Um dia, após um jantar em que ela parecia, mais que nunca, não ter nenhuma pressa em tomar seu caminho, ele abriu um vinho, fechou as portas, apagou as luzes deixando somente as velas, sentou-se à sua frente, e num sorriso lhe disse, sincronizando com a música:
_ Não quero mais esse negócio de você longe de mim.
E certamente, a estória continuou…

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