segunda-feira, 14 de abril de 2008

Reunião

Ela acabou de falar e olhou ao redor para saborear o efeito que suas idéias produziram.
Levantou seus grandes olhos morenos, as grossas sobrancelhas ainda tensas do esforço de manter o foco só no que estava falando.
Finalmente rendeu-se e procurou o olhar dele.
Como esperava, encontrou: aprovação, um traço de diversão, e aquela admiração que lhe proporcionava um gozo íntimo e particular indizível.

Sorriu.

Arrependeu-se naquele momento de ter arrumado os longos cabelos negros em um coque no alto, o que lhe dava um ar mais adulto, mas que agora a impedia de jogá-los para trás causando aquele certo impacto sensual feminino (quantas manhas e artimanhas contam as mulheres??) Teve que se contentar em enrolar os raros fios que deixara pendentes nas têmporas.

Cruzou os braços e ateve sua atenção ao assunto discutido, agora por outro colega.

Vã tentativa.

Adivinhou o olhar dele procurando o dela.

Para ambos a reunião havia acabado. Ela já dissera tudo que nescessitava ser dito.
O colega delongava-se em redundâncias do já ouvido.
Não, não iriam comprar a nova sede para a associação, iriam reformar, ou antes, restaurar a antiga. O casarão velho e charmoso do final do século, que sabia tantos momentos seus.

Manteve o olhar nas anotações rabiscadas em sua agenda. Mas sabia o dele a perscrutá-la.
Agora ele daria um suspiro calmo e adequadamente encerraria a reunião que finalizara da exata maneira que ele predissera, até porque era a forma mais coerente.
E era sempre assim.

O que sucederia então???
Aquele nervoso momento inevitavelmente se apresentava.
Nunca sabia se levantava e saía ou esperava.
Não conseguia pensar, decidir.
Às vezes acabava por tomar a atitude errada.
Na dúvida, aguardou. A respiração quase suspensa...
Os outros já iam saindo. Onde estava ele???

Viu-o descendo as escadas conversando com uma das moças.
Só restara ela ali.
Resistiu um pouco à maldita ansiedade e foi descendo os degraus até a ante-sala.
Apagou a luz do hall e estava fechando a porta quando ele apareceu novamente e disse-lhe que esperasse um pouco.
Estava por trás dela com o braço por sobre seu ombro empurrando gentilmente a porta, de forma que seu cheiro a invadiu de imediato a acendendo.
Céus!! Aquele homem a desconcertava sempre.

_ Vamos conversar. _ ele pediu.
Olhou-o. Olharam-se.
Um homem. Senso latu e estricto.
Experiência, charme, poder, inteligência sedução. Um ar propositadamente casual, cabelos longos com fundas entradas na testa, dando-lhe uma certa sobriedade. Toda uma vida anterior a ela, compromissos, posição, propriedade.
Ali: Um homem.
Ela quase uma menina, o que o seduzia.
Sem dúvida uma mulher, o que o intrigava e enlouquecia.
Juntos, mergulhando em olhares, um e outro tinham a idade do tempo.
Naquele instante, o tempo inexistia.

Abraçou-a de modo terno e então começou a beijá-la intensa e apaixonadamente.
Rápido foi lhe tirando a roupa e quando deu por si estava em cima da mesa recebendo-o inteira num frenesi delicioso. Ela perdia-se nele. Encontrava-se e tornava a perder-se. Submergia em seus afagos, estremecia em sua língua, que explorava pontos infinitos de sua feminilidade. Enredava-se em seus cabelos e aspirava o sensual perfume que produziam na alquimia de seus corpos em êxtase.
Embalava-se na sensação de tê-lo em seu âmago e perdê-lo entre os dedos e lábios, escorregando no gozo.
A pequena mesa gemia suas carícias. A luz da rua despejava em tudo uma atmosfera de fatalidade.
A mesa não resistiria mais.

Em sua cabeça ecoava um velho poema...
Rêves du matin,
que un jour a cette plage
le soleil nous reveille
y avec son rayon
touche les nuages
y nous invite
de promêner loin
tout seul
main dans la main
ce chemin infinit,
sur les sables rouges et gris.
Não lembrava o autor, mas exibiu-se recitando para ele que sorriu doce e elogiou seu francês.

Ela era feliz.
Morreria depois, inúmeras vezes.
A cada reunião, a cada encontro, a cada final de semana sabendo-o eu sua vida, que não era a dela.
Agora era completa. Era mulher.
Amante! Amada! Deliciada!

Foi juntando suas peças e ventindo-se sob o olhar acariciante dele.
Disfarçava a angústia da despedida próxima, fazendo comentários cáusticos sobre as desigualdades entre homem e mulher.
Ele ria.
Beijou-a novamente e saíram juntos para a neblina.
Seguiam caminhos diversos, vidas próprias.
Até o próximo momento de paixão.


Algum lugar entre 1993/1995.
Poema: Numa aquarela da praia do Frances em Maceió, as palavras de um alemão embevecido com as praias e as meninas brasileiras. Jan/1982.

5 comentários:

Anônimo disse...

Lindíssimo: delicado e sensual.
E a suavidade está, sobretudo, no ritmo do texto. Delicioso!

- Autópsia - disse...

Gostei. Um simples toque... falo da 'luz vinda da rua noturna, derramada sob a sala e mesa...' trouxe olhos mais abertos a minha imaginação. Visite autopsias da primavera, meu obscuro óbvio. Abç

Juliana Vermelho Martins disse...

Adorei!
Vivi a cena toda.
Acabei de ler com as faces coradas!
Uau!!!

Alessandro Palmeira disse...

Delicadamente ardente, furiosamente sensual.

André Ambrosio disse...

Mafagafinha,

Nada novo?? Daqui a pouco eu vou enjoar dos textos do tempo do epa...

=P